Escravos da Aparência
Recentemente li na revista Isto, uma entrevista ao médico psiquiatra Roberto Shinyashiki, intitulado “Heróis de verdade”, o escritor combate a supervalorização das aparências. À medida que ia lendo a entrevista, as palavras do escritor e alguns aspectos da minha vida eram tudo menos coincidência, parecia que ele falava de mim, a cada frase dele o coração apertava tanto que a um determinado altura dei uma pausa, não vai o Diabo “tecê-las” e num instante “Puf” e lá vou eu certificar-me da existência ou não do Onipresente(Risos). Quando questionado sobre a existência de heróis, ou melhor, se eles são de verdade? O escritor responde: “Nossa sociedade ensina que para ser uma pessoa de sucesso, você precisa ser diretor de uma multinacional, ter um carro importado, e viagens de primeira classe... Isso é uma loucura” conclui.
As suas palavras pertinentes levam o meu celebro a levantar questões.
Quem sou eu? Quais eram os meus sonhos de infância... Quem eram os meus heróis? Onde e quem são as minhas raízes? O mundo transformou-se num “Ring” de vale tudo, o ser humano sofreu uma metamorfose, somos um modelo estereotipado, onde quem não se adapta ou quer fazer parte desse modelo é considerado fracassado, uma espécie aparte, seres destinados à quarentena pelo simples facto de ter estampado na cara o F de Fracassado. Perante a tal realidade, não seria de todo impossível eu afirmar que não me reconheço, para uns talvez sim, para outros, pura demagogia. Para dissipar as duvidas proponho exercício de recuar no tempo.
Eu vou voltar no tempo, para minha infância, fecho os olhos e volto para minha amada Bissau, ao meu berço, num pescar de olhos, estou no meu antigo infantario “Jardim Teresa Badinca” as caras... Os colegas, os professores, os funcionários, as salas, e claro o espaço mais importante, o “palco” de todas as brincadeiras o pátio. Uma leve brisa acarinha a minha cara, como se de um bem-vindo a casa se trata, Sim... Estou de volta ao lugar onde tudo tem e faz sentido, onde a hora não passa, e tudo é permitido, não estou como a Alise no país das maravilhas, estou num mundo onde às “pessoas não são tratadas como fracassadas, porque não conseguem ter carros, nem casas esplendorosas” este mundo esta lotada de pessoas simples e transparentes”.
Nesta dimensão paralela a minha realidade de adulto, “Heróis de verdade” são pessoas que trabalham para realizar seus projectos de vida, todos os sonhos são possíveis, o equilíbrio existente permite que pessoas entendam que é natural e necessário pedir desculpas, e admitirem os erros. Aqui as pessoas não têm medo, e nem a vergonha das suas raízes, posso dizer que os meus heróis são e serão sempre Imbarri e Domingas, para sempre os melhores pais, neste ou em qualquer mundo, ele começou como motorista, ela era enfermeira, tenho orgulho do bairro de Santa Luzia que me viu nascer, crescer, onde era o “terror” da vizinhança, que perdoava minhas “travessuras”, rindo-se delas, mas mais importante fazendo com que eu me sentisse em família em todas as casas. As brincadeiras com meus amigos de infância, os jogos de futebol, as casinhas de areia, e os inesquecíveis banhos a chuva, momento de puro deleite, uma sensação única que todas as crianças deveriam ter o prazer experimentar.
Éramos crianças com uns belos sorrisos, os meus sonhos de crianças estão tão frescos que os posso “sentir” seu cheiro, sonhos de aventuras, de magia, típicas de “almas despreocupadas” com tempo e espaço. De volta ao mundo de adulto, me pergunto, se o resultado dessa viagem foi benéfico? Sim foi! Primeiramente porque me lembrei de pessoas, lugares e coisas que eu julgava esquecidas, depois porque resgatei os ensinamentos e a humildade com que me foram transmitidas pelos meus pais, entendi que é natural ter medo e insegurança quando se trata de fazer escolhas, tomar decisões, porque nem sempre irei acertar, mas há que ter humildade de reconhecer esse facto, porque é necessário ter presente que nesta vida não iremos conquistar tudo que desejamos, porque tudo o resto são apostas e possíveis erros. A vida gira a volta do que realmente desejamos, então não há necessidade de viver um conto perfeito, nem se submeter a “ditadura de aparências”.
A esperança e o pessimismo são dois lados da mesma moeda, por isso temos que decidir pela esperança sempre, e seguir em frente pode não parecer, mas somos-nos que decidimos, por isso é importante viver de acordo com a nossa própria expectativa, e não em função de terceiros. Mentalize-se que nem sempre ser perfeito e viver de aparências é o mais importante. O que vai ter mais impacto no final do dia é o facto de você saber ou não quem és tu, de onde vens, porque se souberes, as portas do teu destino abrissem-a naturalmente.
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